ATA DA QÜINQUAGÉSIMA SEXTA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLA­TIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 29.11.1989.

 


Aos vinte e nove dias do mês de novembro do ano de mil novecentos e oitenta e nove reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Qüinquagésima Sexta Sessão Solene da Primeira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a assinalar o transcurso do “Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino”. Às dezesseis horas e dezessete minutos, constatada a existência de “quorum”, o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou aos Líderes de Bancada que conduzissem ao Plenário as autoridades e personalida­des presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Valdir Fraga, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Tenente-Coronel Álvaro Ferreira, representando o Governo do Estado do Rio Grande do Sul; Dr. Ahmad Sobeh, representante da Organização da Libertação da Palestina no Brasil; Sr. Sharif Saleh, Presidente da Sociedade Árabe Palestina Brasileira da Grande Porto Alegre; Sr. Mauro Nadvorny, representante da Organização Sionista Unificada do Rio Grande do Sul: e Ver. Lauro Hagemann, 1º Secretário deste Legislativo. A seguir, o Sr. Presidente manifestou-se a respeito da homenagem ora prestada pela Casa, e concedeu a palavra aos oradores que falariam em nome deste Legislativo. O Ver. Giovani Gregol, em nome da Bancada do PT, destacou qualidades do povo palestino e discorreu sobre a criação do Estado Palestino, por deliberação a ONU, em mil novecentos e quarenta e sete, e até hoje não consumado. Manifestou apoio à luta pela libertação da Palestina, propugnando pela convivência pacífica entre israelenses e palestinos. O Ver. João Dib, em nome da Bancada do PDS, manifestando seu anseio de que todo o mundo vivesse em paz, cotejou despesas realizadas com a guerra e as dispendidas para a paz e o envolvimento de interesses internacionais nos confrontos entre judeus e árabes. Postulou pelo entendimento comum entre esses povos em prol da paz e pelo Estado palestino. O Ver. Airto Ferronato, em nome da Bancada do PMDB, congratulando-se com o Ver. Omar Ferri pela iniciativa da solenidade, augurou que o dia de hoje, internacionalmente dedicado à solidariedade ao povo Palestino, preste-se à reflexão sobre os direitos dessa Nação. O Ver. Luiz Braz, em nome da Bancada do PTB, registrando a presença de numeroso público em Plenário, asseverou ser fato decorrente da união crescente do movimento dos defensores da causa palestina.E referindo notícia publicada no Jornal Correio do Povo, de quatorze de março de mil novecentos e oitenta e oito, manifestou a necessidade de união dos palestinos e do crescimento do nível de consciência quanto a sua causa. O Ver. Lauro Hagemann, em nome da Bancada do PCB, citando resolução da ONU, de criação dos Estados Palestinos e de Israel, expressou sua solidariedade à causa palestina e sua admiração para com aquele povo pela constância de sua luta e conservação de suas tradições, língua e costumes. Propugnou pelo apoiamento, por parte do brasileiros, em favor do Estado Palestino. O Ver. Omar Ferri, como autor da proposição e em nome das Bancadas do PSB, PL e PDT, leu trechos do “Poema da Terra”, de Mahamud Darwish, e citando declarações do Sr. Saleh Baja sobre sua condição de estrangeiro em sua própria terra, declarou ser “impossível que em qualquer território do mundo um povo seja substituído por outro”. Em prosseguimento, o Ver. Omar Ferri procedeu à entrega de quadros, trazidos de Genebra, em solidariedade ao povo palestino, à Srª Fátima Ali e ao Sr. Bacri, representante da Sociedade Árabe Palestina no Estado do Rio Grande do Sul. Após, o  Sr. Presidente concedeu a palavra ao Sr. Mauro Nadvorny, representante da Organização Sionista Unificada do Estado do Rio Grande do Sul, o qual manifestou sua fé na convivência pacífica entre os povos judeus e palestinos. E o Sr. Ahmad Sobeh, representante da Organização da Libertação da Palestina no Brasil, referindo manifestações de solidariedade que o povo palestino tem recebido no mundo, propugnou que seja feita e dirigida pressão sobre o governo de Isaac Shamir em prol da paz. E, em ato contínuo, procedeu à entrega, ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, de cópia de Carta do Presidente Arafat, dirigida ao mundo pelo transcurso do Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino. Às dezessete horas e cinqüenta e um minutos, o Sr. Presidente levantou os trabalhos, convidando as autoridades e personalidades a passarem à Sala da Presidência e convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Extraordinária a ocorrer amanhã, às nove horas e trinta minutos. Os trabalhos foram presididos pelo Ver. Valdir Fraga e secretariados pelo Ver. Lauro Hagemann. Do que eu, Lauro Hagemann, 1º Secretário,  determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente e por mim.          

 

 


O SR. PRESIDENTE: Damos início a esta Sessão Solene requerida pelo Ver. Omar Ferri. De imediato, concedemos a palavra ao Ver. Giovani Gregol, que fala pela Bancada do PT.

 

O SR. GIOVANI GREGOL: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, demais autoridades, senhoras e senhores aqui presentes, em primeiro lugar, eu gostaria de dizer que é uma honra para mim ter sido escolhido pela minha Bancada, como o orador que representará o Partido dos Trabalhadores nesta solenidade. Sr. Presidente e demais presentes, é longa e árdua a luta dos povos pela sua libertação. Sem dúvida, a história do povo palestino, especialmente a sua história neste século, é um exemplo desta afirmação, um exemplo de luta, de obstinação, de amor a terra e de resistência popular.

Estamos, hoje, homenageando os palestinos de todo o mundo e, em especial, aos palestinos do Rio Grande do Sul e da nossa amada Cidade de Porto Alegre porque aqui, também, na nossa Pátria Brasil, no nosso Estado, eles dão a sua contribuição fundamental a nossa vida cultural, política e econômica. Nesse dia internacional de solidariedade ao povo palestino estamos seguindo, rigorosamente, uma determinação da Organização das Nações Unidas que no dia 02 de dezembro de 1977 sugere que, nesta mesma data, em todos os anos, se realizem atos de solidariedade ao povo palestino. Nessa mesma data, em 1947, a ONU votava o plano de partilha que recomendava a divisão palestina e essa região é assim chamada há muitos séculos, porque lá eles vivem milenarmente em seis partes, três das quais seriam destinadas à formação do Estado Judeu e as outras três à formação do Estado Palestino. Essa deliberação da ONU tomada por ampla maioria, infelizmente, até hoje não se consumou e continua sendo a suprema meta do povo palestino, que conta com toda a nossa solidariedade e com todo o nosso apoio. Esse povo é um povo importante, um povo que tem história, porque os atuais palestinos, outra coisa não são que os chamados antigos filisteus do Velho Testamento que chegaram à região, hoje Palestina, antes do século 25 antes de Cristo, ou seja, antes de 2500 antes de Cristo lá eles vivem, lá eles habitam, lá eles exercem as suas atividades. E tem uma bela cultura que possuiu grandes literatos, grandes poetas, artistas, intelectuais, cientistas, pessoas que se destacam em todas as áreas de atividade e do conhecimento humano. É também um povo simples. Apegado à terra e em grande parte dedicado, ou que era dedicado quando tinha terras, às lides agrícolas. Era um povo alegre. Ainda tenta ser alegre, ainda consegue ser alegre. Mas é preciso dizer que é hoje um povo sem pátria, ou melhor, a sua pátria não lhes pertence, ainda, lhes foi retirada, lhes foi roubada. Nós conhecemos muito bem a complexidade, Sr. Presidente e autoridades aqui presentes, do problema palestino. Sabemos da delicadeza das questões que envolvem o problema árabe-hebreu. Mas o reconhecimento destas dificuldades, da profundidade desta problemática não nos impede, observando o problema, de ter sobre ele uma opinião.

O Partido dos Trabalhadores, desde a sua fundação há pouco mais de 10 anos, sempre se distanciou das posições maniqueístas do tipo mocinhos e bandidos, do tipo monstros e anjos. Sucede que, a bem da verdade, o nosso partido sempre apoiou e apoiará a luta de libertação do povo palestino. (Palmas.) E a luta de libertação do povo palestino tem um objetivo maior e inarredável que é a criação e manutenção do Estado Palestino, da sua terra, da chamada Palestina. Neste sentido nós apoiamos integralmente esta reivindicação e este objetivo de luta que será conquistado de várias formas, inclusive com sangue. E a própria Organização das Nações Unidas, em várias e várias determinações, já tem ao mundo todo declarado que este Estado Palestino deve se formar naqueles territórios árabes ocupados por Israel, especialmente a partir do ano de 1967. Também somos a favor da manutenção do Estado de Israel, assim como o povo palestino representado pela OLP – Organização de Libertação da Palestina, o deseja e assim o tem manifestado a todo o mundo. E porque somos a favor da paz, afirmamos que esses dois Estados deverão conviver pacificamente. Aliás, a formação do Estado Palestino realmente é a única possibilidade que nós temos de pacificar o Oriente Médio, não existe alternativa, porque enquanto o povo palestino tiver negado o direito a sua pátria, a sua nacionalidade e a sua terra, nós, certamente, não teremos paz no Oriente Médio!

A criação do Estado Palestino, inclusive, já foi decretada pelo Conselho Nacional Palestino, no exílio, a partir do fenômeno, a partir do movimento chamado “Intifada, a Revolução das Pedras”, que explodiu a partir de 8 de dezembro de 1977, justamente nesses territórios ocupados que são reivindicados como a área, foram declarados, inclusive, como área livre e território do Estado Palestino e que alguns países do mundo ainda se recusam a reconhecer. Nós sabemos que existe aquela famosa frase, Sr. Presidente, aquela famosa máxima do pensador Von Klasewvitz que diz que: “A guerra é a política feita com outros meios.” Concordemos ou não com esta máxima, é preciso reconhecer que ao povo palestino em determinado momento da sua história não restou outra alternativa, infelizmente, e certamente contra a sua vontade, do que pegar em armas. Esta fase também está, felizmente, superada ou tende a ser superada e neste sentido, inclusive, as declarações dos seus representantes em nível mundial, em nível nacional ou local tem se feito ouvir.

Mas esta Intifada, que é uma luta de pessoas, civis desarmados, de velhos e de crianças, de mulheres e de adolescentes, armados com pedras, muitas vezes, contra tropas armadas com armas, armamentos extremamente sofisticados, já rendeu muitas vítimas. Existem vários levantamentos a este respeito, eu não quero citar todos, mas eu quero citar apenas alguns dados a este respeito que inclusive não são dados da OLP, ou de qualquer entidade ligada ao povo palestino, mas dados oficiais da Anistia Internacional que, nesses dois anos de Intifada, de revolta popular neste território, em 22 meses de Intifada, informa que tivemos mais de 800 mortos, 40 mil feridos, dos quais 17 mil ficaram com danos físicos permanentes, ou seja, são mutilados; mil e quinhentas mulheres abortaram devido ao uso de gases altamente tóxicos. Estes dados são da Anistia Internacional, repito, entidade reconhecida mundialmente, pelo seu trabalho em defesa dos direitos humanos. Além disso, outros dados que nós temos é que são 42 mil detidos e universidades foram e continuam fechadas, centros de saúde, 11 mil presos políticos, além dos exilados, e assim por diante. É por isso que eu citava esta luta que o povo palestino está fazendo, inclusive, à custa do sangue de seus filhos, dos melhores filhos, das suas crianças e dos seus jovens, inclusive. Nós sabemos bem que erros, crimes e atrocidades foram cometidos pelos dois lados. O Partido dos Trabalhadores tem clareza disto. Mas nós temos clareza, também, que hoje se concretiza sobre o povo palestino, em especial nas áreas ocupadas, um terrorismo de estado extremamente armado e equipado, e apoiado no imperialismo internacional que ataca essas pessoas indefesas, e ainda tem a coragem de se justificar chamando a elas, ou aos seus representantes, de terroristas, quando na realidade eles é que são terroristas. E nós caminhamos para uma solução que, naturalmente, só poderia ser uma solução negociada, uma solução pacífica, na medida em que a legítima representante do povo palestino no planeta, que é a OLP, que tem 98 embaixadas em todo o mundo, que é membro oficial das Nações Unidas, que tem representações em outros tantos países, inclusive o nosso, reconhece a existência do Estado de Israel, deseja, com a formação do Estado Palestino, com ele conviver pacificamente, e através do seu Conselho Nacional, recentemente reunido, faz uma série de outras reivindicações e firma posições que eu gostaria de ler rapidamente: (Lê.)

“1. Apoyar la convocatoria de una Conferencia Internacional de paz para el Medio Oriente sobre la base de las resoluciones de la ONU y la garantía de los legítimos derechos nacionales del pueblo palestino, siendo el primero de ellos el derecho a su autodeterminación, avalado por la Carta de las Naciones Unidas que confirma ese derecho para todas las naciones, rechazando la ocupación de otros territorios mediante el uso de la fuerza militar.

2. El retiro del ejército de ocupación israeli de todos los territorios árabes y palestinos ocupados en 1967, incluida Jerusalén.

3. Anulación de todas las medidas de anexión y desmantelamiento de los asentamientos que Israel ha establecido en los territorios árabes y palestinos desde 1967.

4. Colocar todos los territorios palestinos ocupados incluida Jerusalén bajo la supervisión de la ONU por un período limitado, para proteger a los palestinos, garantizar un clima favorable al éxito de la Conferencia Internacional y alcanzar una solución política y total, con miras a la seguridad y paz para todas las partes a través de un acuerdo mutuo y resguardando el derecho del Estado Palestino para ejercer su voluntad en forma libre y soberana sobre los territorios referidos.

5. Solución del problema de los refugiados palestinos sobre la base de las resoluciones de la ONU a este respecto.

6. Garantizar la libertad en el ejercicio de sus derechos y prácticas religiosas en Palestina a todos los fieles de las diferentes religiones.

7. El Consejo de Seguridad tomará las medidas pertinentes y garantizará la paz y seguridad de todos los estados de la región incluido el Estado Palestino.

Esta iniciativa de paz cuenta con el respaldo de la ONU, la Comunidad Europea, la Organización de Países Islámicos, la Organización de Países no Alineados, la Organización de Unidad Africana y de la comunidad internacional en general, con la sola excepción de Estados Unidos e Israel.”

Essa iniciativa, senhores, conta com o respaldo da ONU, da Comunidade Econômica Européia, da Organização dos Países Islâmicos, da Organização dos Países não alinhados, da Organização da Unidade Africana, da Comunidade Internacional em geral, com a exceção, apenas e ainda, dos Estados Unidos e do Estado de Israel. De forma que, com toda a tranqüilidade, com toda a convicção, com toda a transparência, com toda a meridiana certeza de que nós estamos apoiando uma causa justa, historicamente justa, que estamos apoiando um povo que luta e precisa ter a sua pátria assim como outros as têm e as conquistaram, que o PT vem saudar, nesta data, e prestar a sua solidariedade ao povo palestino. Viva o Povo Palestino! Viva o Estado Palestino! Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Ver. João Dib fala pela Bancada do PDS, a sua Bancada.

 

O SR. JOÃO DIB: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, meus senhores, minhas senhoras, meus patrícios árabes. Todos os meus ascendentes são árabes e, portanto, não posso ter no meu coração senão a preocupação com todos aqueles que têm o mesmo sangue que eu. Sou, portanto, um árabe preocupado com os árabes, mas também sou um homem do mundo. E o meu coração também quer que no mundo ninguém tenha preocupações. Eu gostaria que todo o mundo pudesse viver em paz e que todo o mundo tivesse a tranqüilidade assegurada para a sua família, para seus filhos e para todos aqueles que lhe são caros.

Ouvi, um dia, que num quadrado com 35 km de lado seria possível colocar toda a população do mundo. Trinta e cinco quilômetros de lado num quadrado da 1.125 km2. É menos do que a terra onde eu nasci, que tem 5 mil km2 – Vacaria tem quatro vezes o suficiente para colocar toda a população do mundo. Dá para colocar quatro pessoas do meu tamanho em um metro quadrado e sobra lugar. Agora, vejam, as crianças que há neste mundo e os menores do que eu. E o mundo briga sem que chegue a nenhuma conclusão. Se gasta mais na guerra do que na paz. Todo dinheiro gasto na guerra, diariamente, e ninguém no mundo teria fome, ninguém teria necessidade de procurar casa, porque o dinheiro da guerra dá para fazer tudo o que o mundo necessita. Mas não dá para entender o mundo. O mundo continua fazendo guerra. Guerra por causas justas, às vezes, e a maior parte das vezes por causas injustas. Guerra, onde os participantes não estão no local da guerra, muitas vezes, estão bem longe, deixando no lugar os menos favorecidos pela sorte, os menos poderosos, brigando entre si, enquanto que os que tiram proveito estão longe distribuindo armas, vendendo e comprando consciências, tornando o mundo cada vez mais difícil. Guerra, por exemplo, agora, lá em Israel, que termina infelicitando o Líbano do Hamid Iskandar e meu, que nada tem a ver, não apóia um lado nem apóia outro, mas o Líbano é a Suíça do Oriente e está cada vez mais premido pelos interesses desencontrados, mas que não estão lá no Líbano, que não estão no meio dos muçulmanos. Mas tem outros lá, sentados em grandes edifícios, com ar condicionado, criando problemas para judeus e árabes, mas lá, muito longe, sem sofrer coisa alguma. E isso deixam preocupados todos aqueles que são cidadãos do mundo. Porque, para mim, tenho profundo carinho pelos árabes, porque são o meu sangue e nem poderia ser diferente. Sou brasileiro, mas os meus pais vieram casados do Líbano e aqui eu nasci. Mas o meu coração também tem um pedaço muito grande para o Líbano dos meus pais e, conseqüentemente, para todos os povos árabes, mas o meu coração de homem do mundo tem lugar para todo mundo.

E se eu disse que é possível colocar toda população do mundo num quadrado de 35 quilômetros de lado, não entendo por que judeus e árabes não possam sentar e acertar áreas que dão para os dois, fazer com que aquelas pessoas que em 1967 foram retiradas de suas terras possam voltar e construir suas casas, seus lares, plantar, ter as suas crianças no colégio e crescerem tranqüilamente. Mas se é possível, aqui no Brasil, judeus e árabes sentarem, por que não lá? É porque fora dos interesses de árabes e judeus que estão na Palestina, há outros interesses que são internacionais, não são nem de árabes nem de judeus. Não posso entender, e num programa de rádio e de televisão que aqui participou o Salles, porque todos os palestinos não têm um passaporte e podem voltar à sua terra. Uma das coisas que me comove é uma pessoa idosa, doente, querer voltar para a Palestina. Mas por não ser naturalizada brasileira não pode ter um passaporte e, por isso, não pode voltar para sua terra, ver seus familiares, e talvez até morrer naquela terra. Essa me parece uma das coisas mais importantes: um passaporte! E, talvez, fosse por aí que devesse começar tudo: um passaporte! Muito simples e muito pouco e, talvez, tivéssemos mais tranqüilidade, mais acertos, menos desacertos.

O eminente Ver. Gregol colocou, aqui, uma conferência internacional de paz e acho que é possível. Vejam os senhores, que hoje, dia de solidariedade ao povo palestino – e deveria ser todos os dias de solidariedade ao povo palestino, não só este – está aqui o Dr. Mauro Nadvorny representando a entidade sionista, mostrando que é possível sentar a mesma mesa com a OLP sem nenhum atrito, com cavalheirismo, com a educação que Deus deu a todos nós. Então, é possível haver isso, desde que haja menos influências externas. Vamos pedir a Deus, ou a Alá, ou Jeová, que isso aconteça o mais breve possível e que os palestinos possam morar tranqüilamente nas suas terras e que a autodeterminação exista para um e outro lado. E que a ONU possa dar a sua contribuição para que essa paz se acelere, porque vem matando gente, infelicitando lares, infelicitando famílias sem nenhuma necessidade maior. Há lugar para todos e a boa vontade de todos os lados, me parece, mas alguma coisa está faltando para que esse entendimento e, nesse dia, peço em nome da minha Bancada, a Bancada do PDS, que tem dois descendentes de libaneses, dois filhos de árabes, que a paz seja conseguida muito rapidamente e que os palestinos possam ter a tranqüilidade a que têm direito. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Airto Ferronato, que fala pelo PMDB.

 

O SR. AIRTO FERRONATO: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, senhoras e senhores aqui presentes, é com profundo respeito que hoje ocupamos esta tribuna, em nome da Bancada do PMDB com  assento nesta Casa Legislativa, no dia em que a opinião pública mundial manifesta sua integral solidariedade ao povo palestino. Cumprimentamos nosso colega, proponente desta Sessão, Ver. Omar Ferri, que com este gesto ratifica seu ideal e sua trajetória de luta constante na defesa dos direitos humanos. Queremos, também, nos irmanar com o sentimento desta Casa na pessoa do seu Presidente, que sempre abrigou em seu interior e abriu espaço para aqueles que querem se expressar e comungar de causas tão justas quanto esta.

Senhoras e senhores, mais do que manifestação de solidariedade, o dia de hoje deve constituir-se na reafirmação e continuidade do processo de reflexão e conscientização da luta histórica deste povo disperso, fragmentado, depredado e mais do que isso, negado em sua história, na sua cultura e na sua própria existência. Vale dizer que, a par disto, o povo palestino têm conservado de forma vigorosa o seu caráter, sua identidade e unidade nacional. Apesar de sumariamente expulsos de maneira tão degradante e indigna de seu território, carregam a pátria dentro de si. Para eles, a conservação da pátria palestina é a garantia da própria sobrevivência, é o reconhecimento dos seus direitos, seus valores culturais e seu caráter nacional.

Para nós é muito difícil, num breve espaço de tempo, discorrer sobre a imensa e intensa caminhada desta gente em busca da sua terra. O sentimento de perda, de injustiça e o sofrimento deste povo representado pelo massacre de Sabra e Chatila dão a dimensão exata, de um lado, da estupidez humana, de outro, da tenacidade e capacidade de renúncia, resistência e sacrifício deste povo.

Sabemos, também, que sua dignidade, enquanto povo e nação, só será restabelecida quando pisarem definitivamente em solo pátrio. Enquanto isto não ocorrer, a consciência mundial continuará enferma e continuaremos a ouvir os gritos daquela sobrevivente dos campos de Sabra e Chatila, que em meio aos escombros e corpos trucidados de homens, mulheres e crianças indefesas, pedia a Deus que viesse ali ver aquele crime hediondo estarrecida e impotente diante de tanta barbárie cometida da forma mais covarde.

Para encerrar, Sr. Presidente e Srs. Vereadores, ficamos com as palavras de Arafat depois da agressão consumada: “A opinião pública mundial é conclamada, agora, com mais veemência do que em qualquer época, a contribuir para o processo de pacificação do Oriente Médio,  apoiar integralmente o direito de nosso povo à autodeterminação e à construção de seu próprio estado independente. Há décadas nosso povo luta por sua independência, nós nos sacrificamos muito. Mas continuaremos na luta para alcançar nosso objetivo, não importa quantos sacrifícios mais isto nos custe”.

Temos certeza de que esta deve ser a contribuição de todos nós para que o sangue derramado de milhares de inocentes não tenha sido em vão. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Luiz Braz, que falará em nome do PTB.

 

O SR. LUIZ BRAZ: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, senhoras e senhores, é com muita satisfação que eu vejo pela primeira vez esta Câmara Municipal receber, no Dia de Solidariedade ao Povo Palestino, um público tão grande. Isto é sinal que o povo palestino começa, aqui em Porto Alegre, aqui no Rio Grande do Sul, a se conscientizar de que apenas unidos é que conseguirão os seus objetivos. Em anos anteriores, quando fazíamos esta homenagem aqui na Câmara Municipal, era com muita tristeza que víamos que o chamamento para que o povo palestino viesse participar daquela solenidade, daquela homenagem, daquele ato, não era ouvido. E hoje, graças a Deus eu vejo que as coisas começam a se modificar.

Eu ouvi o que o Ver. João Dib falou dos seus ascendentes árabes, e devo dizer que, além da amizade que me une ao povo palestino, também eu carrego por parte da minha mãe o sobrenome Mush, que vem da raça Síria, e isso faz com que aquela ligação, aquela região e os acontecimentos daquela região, sejam maiores.

Eu estava, hoje, revendo uma matéria do saudoso “Diário do Sul”, do ano de 1988, por ocasião desta oportunidade. Faz mais ou menos um ano que o Diário do Sul deixou de circular. Eu lembro muito bem que o Diário do Sul, numa matéria bem grande sobre o povo palestino, me esclarecia algumas dúvidas que, inclusive, devem ser dúvidas de muitos. Eu vi, por exemplo, o meu amigo João Dib se referir àquele conflito como se fosse um conflito entre judeus e palestinos e, pelo menos naquela matéria, eu li que o povo palestino é formado por judeus, cristãos e muçulmanos. E lia, mais ainda, que na Palestina de 1988 viviam um milhão e quinhentos mil árabes e que, numa projeção que fazia o autor daquela matéria, nós teríamos em Israel mais árabes do que praticamente judeus vivendo. E eu tive oportunidade, também, de conhecer mais, naquela matéria, sobre este povo magnífico. Eu soube, também, da dominação dos turcos durante 500 anos sobre aquela área. Soube que, exatamente por causa desta dominação dos turcos é que os palestinos que vieram para o Brasil, por volta de 1950, trouxeram passaporte turco e não trouxeram passaporte palestino. Pudemos, também, nos cientificar, com aquela matéria, que a ousadia desse povo, a predestinação desse povo, a objetividade desse povo de reconquistar aquela área que é sua, de ficar naquela área que é sua, de poder conviver com os seus parceiros israelenses é tão grande e este movimento cresce a tal ponto que, em nenhuma vez que eu conversei com algum palestino, nos movimentos todos nos quais eu participei, eu ouvi, de algum palestino, palavras de ódio contra o povo judeu ou contra o povo israelense. Todos os palestinos com os quais mantive contato, sempre existiu uma boa disposição de poder se fazer um relacionamento, dos palestinos voltarem para aquela região e terem um bom relacionamento. Mas são matérias como estas, e vou pedir licença a minha amiga Fátima, que nunca faltou, em nenhum momento, dos movimentos do povo palestino, para ler uma matéria que saiu no Correio do Povo, no dia 14 de março de 1988, e essa matéria relata a estada da Fátima e do seu noivo, naquela ocasião, naquela região, e isso faz com que possamos chegar mais um pouco perto da realidade, e sabermos que a luta vai ser muito intensa para que o objetivo do povo palestino possa se dar, e tenho aqui companheiros representantes da colônia judaica, não é uma luta contra o povo judeu, mas a favor de um povo. Quando lemos uma matéria dessas, realmente, chegamos até a ficarmos arrepiados. E diz assim: (Lê.)

“Os campos de refugiados são verdadeiros campos de concentração. O sionismo está fazendo com o povo palestino o mesmo que os judeus alegam ter sofrido na Segunda Guerra” – disse o médico Sidnei Pacheco, que ao lado de sua noiva Fátima Ali, enfermeira, presenciou cenas chocantes: mulheres grávidas espancadas até o aborto, jovens baleados nos genitais para que não possam reproduzir, famílias inteiras torturadas. Nem as crianças são poupadas pelos judeus. Os brasileiros viram os soldados israelenses quebrando braços das crianças enquanto diziam a elas que isso era para não jogarem mais pedras. Eles afirmaram, também, que o Exército de Israel está usando um novo tipo de gás lacrimogêneo de fabricação norte-americana, que tem efeito abortivo”.

Isto aqui foi uma matéria publicada em março de 1988, no Jornal Correio do Povo, relatando a visita da Fátima Ali e do seu noivo naquela região. Quando a gente vê matérias como esta, a gente vê que realmente aqueles discursos feitos aqui da tribuna, aquelas palavras que muitas vezes nós ouvimos e que parece que tudo está conduzindo para um acerto, um entendimento muito rápido, quando a gente vê isto parece que não é bem assim. Parece que o nível de conscientização do povo tem que crescer. Parece que a união do povo tem que crescer, exatamente para que a luta possa ser acelerada, porque os obstáculos são grandes, são muitos e eu me lembro, agora, da visita e do encontro que eu tive com o representante da OLP por ocasião da inauguração do Templo da Legião da Boa Vontade em Brasília. Não faz muito tempo isto, faz um mês. E depois eu li uma matéria publicada pelo irmão Paiva Netto, que é o Presidente Mundial da Legião da Boa Vontade – LBV, numa conversa que fazia com os palestinos, onde tinha o entendimento que aquela região estaria precisando de uma organização do espírito da LBV, porque a LBV prega exatamente a possibilidade de todos os povos viverem em paz, harmonicamente. Prega que todos os povos podem, num só movimento tentar ajudar a todas as pessoas. A LBV tem feito isto. E dizia o irmão Paiva que nós estamos necessitando exatamente disto para aquela região. E eu acho que para que haja um movimento nesse sentido é preciso que este nível de consciência, que tomou conta de todos os senhores que vieram hoje, aqui, para esta solenidade, que ele possa crescer. Que em outras oportunidades e que em outras solenidades também estejam presentes. E que saibam e que tenham a consciência bem clara de que a luta não está ainda no fim. Que o entendimento que foi pregado aqui pelo nosso colega representante do PT, Giovani Gregol, é um entendimento que está iniciando, mas pelo que relata, aqui, a Fátima Ali, no Jornal Correio do Povo, parece que vamos ter muito tempo para chegarmos até lá. E por isto que a união, mais do que nunca, neste instante. Ela precisa ser a maior possível e o nível de consciência precisa crescer, a ponto de este povo saber que somente unido é que se pode chegar à vitória. Sou grato. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Lauro Hagemann, que falará em nome da sua Bancada, o PCB.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, senhoras e senhores. Em nome do Partido Comunista Brasileiro compareço a esta solenidade, não pela primeira vez, mas por muitas outras ocasiões anteriores para reiterar o nosso apoio, a nossa solidariedade à luta do povo palestino, em nome do internacionalismo que preside as relações do meu Partido com todos os povos do mundo.

A colônia palestina do Rio Grande do Sul nos merece este apreço porque é a maior do Brasil. Praticamente todos os municípios gaúchos têm um representante palestino e isso nos anima a sempre e cada vez mais proclamar este dever de solidariedade dos gaúchos, dos brasileiros para com a luta dos palestinos. E nós obedecemos a uma lógica linear para chegarmos a esta solidariedade compulsiva. A resolução da ONU de 1947 criou dois Estados: o judeu e o palestino. Apenas um pôde ser instituído e por que o outro tem que lutar até hoje para se constituir? Se nós formos rememorar os tempos, 1947 foi o início da Guerra Fria, a expansão do imperialismo que determinou esse tipo de comportamento. E os anos foram se sucedendo e as coisas se complicando até que 32 anos depois, em 1975, a mesma ONU, pela Resolução nº 3.379, declara o sionismo sinônimo de racismo. Isso não é uma condenação ao povo judeu como povo, é uma condenação a uma concepção que dirige grande parte do Estado Judeu e que conflita com a luta dos palestinos pela consecução de sua Pátria, de seu território. Esta é a lógica linear que nos anima a vir mais uma vez manifestar a nossa solidariedade aos palestinos, porque enquanto os palestinos não tiverem o seu território, serão um povo milenar que não terá respeitado o seu direito de ter o seu território, de ter a sua pátria. Por isso é que nós admiramos a constância dos palestinos, principalmente desses que nós conhecemos, em preservar a sua cultura, a sua língua, as suas tradições. Chega a ser comovente! Os espetáculos a que nós assistimos, de crianças palestinas nascidas aqui, distantes de sua terra, que conservam os costumes, as tradições, a língua dos seus antepassados, este é o maior patrimônio que têm os palestinos, que sonham e têm o direito inarredável de um dia voltar a sua terra. E, para isso, nós brasileiros, que subscrevemos aquela Resolução da ONU, porque foi um brasileiro que presidiu a Sessão da Assembléia Geral em 1947, que criou os dois Estados, nós temos a obrigação moral de contribuir para que os palestinos tenham a sua pátria. Saudamos a presença do jovem representante da Organização Sionista Unificada do Rio Grande do Sul nesta solenidade. Não queremos estabelecer a luta fraticida por uma questão racial. Mas não podemos esquecer que ela existe, até para que possamos superá-la, que ela não sirva de exemplo como não devem servir de exemplos outros acontecimentos históricos que deixaram um triste rastro na história da humanidade. Por isso, Srs. Vereadores, membros da Mesa, ilustre colônia palestina, reitero a solidariedade do Partido Comunista Brasileiro a esta luta. Infelizmente é tão pouco o nosso poder de ajudar com mais efetividade, mas sempre é bom sabermos que estamos todos juntos na mesma luta. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Omar Ferri, que falará em nome da Bancada do PSB, PL e PDT.

 

O SR. OMAR FERRI: Sr. Presidente, Srs. Vereadores aqui presentes, minhas senhoras, meus senhores, prezados amigos e irmãos palestinos e palestinas aqui presentes. Leria, em primeiro lugar, a primeira estrofe do “Poema da Terra”, de Mahamud Darwish. Assim se expressa o poeta palestino: “Meu país, longe de mim, como meu coração. Meu país perto de mim, como minha prisão. Por que eu canto, aqui, se meus olhos estão longe? Por que canto por uma criança dormida na relva com uma faca suspensa sobre sua cabeça? Por que esta canção, se minha mãe me estende os braços e morre na minha frente numa nuvem âmbar?”

Eu me lembro, alguns meses atrás, quando o Ver. João Dib levava para ser ouvido na Rádio Guaíba, no programa de Flávio Alcaraz Gomes, o Sr. Saleh Baja, que disse que não tinha passaporte para visitar a sua própria terra e que para chegar até lá e rever seus familiares e amigos teve que receber passaporte expedido por outras terras. O mais importante, o mais doloroso não era este fato. O que se revelava como mais compungente era que o palestino Saleh Baja, três meses depois de permanecer em sua própria terra, recebeu notificação dos senhores da sua própria terra que o visto do seu passaporte tinha se esgotado e ele deveria abandonar o país. É a história dos palestinos, de muitos palestinos, de palestinos como Maomhed Bacri e o meu amigo Hamid Iskandar, todos dignos palestinos que muito corajosamente representam o seu povo e a sua gente, num país que recebeu fraternalmente 40 mil dos possíveis 4 milhões de palestinos que foram obrigados a deixar o seu lar, as suas terras e as suas propriedades.

Eu acho que o Ver. Lauro Hagemann foi muito feliz quando disse que não se trata aqui de nenhuma guerra de conteúdo racial mas, acima de tudo, de uma luta em favor do restabelecimento dos direitos humanos dos palestinos espezinhados pelos invasores. E não diria invasores se os dois territórios fossem mantidos como estado e como nação, mas como só um teve direito a se institucionalizar, eu uso esse termo, porque eles foram obrigados a abandonar os seus lares e isso é muito doloroso para nós que sentimos a dor de nossos irmãos. É impossível, em qualquer território deste mundo, que se substitua um povo por outro povo. Isso é impossível, Baja! E disse um general judeu: “Podemos ganhar dez batalhas, mas não poderemos perder nenhuma”. Mesmo porque naquela região, um povo quando se rebela e levanta a sua tez contra a tirania e contra a opressão, derrota qualquer exército, por mais poderoso que seja. Por acaso os irmãos iranianos não derrotaram o 5º exército mais poderoso do mundo? Essa é a lição da história. Eu considero o direito inalienável do povo palestino de regressar aos seus lares, dos quais foram arrancados e expulsos. Mas não sou eu quem diz essa frase. Ela foi dita em 1956 por um judeu chamado Isaac Deutscher. Essa foi a razão de nós solicitarmos que a Câmara de Vereadores de Porto Alegre homenageasse esse povo tão sofrido e ao mesmo tempo tão heróico. Lembro de um discurso sobre o povo palestino proferido pelo meu amigo e irmão Fawzi El Mashni, em Santana do Livramento, quando lá realizávamos o Encontro Internacional de Direitos Humanos, que partia do princípio que por mais poderosos e armados que sejam alguns países e algumas nações que dão força ao Sionismo Internacional, eles não poderão matar todo o povo palestino, e ele disse: “Eles não poderão matar todo o povo palestino”, e concluiu: “Mas se matarem todos os homens, sobrarão as mulheres para lutar; e se matarem as mulheres? Se matarem as mulheres, sobrarão os filhos para lutar; e se matarem os filhos? Se matarem os filhos, ressuscitarão os mortos que haverão de libertar o chão sagrado manchado de sangue, derramado pelos teus irmãos.” (Palmas.) Termino, então, retomando a poesia do Mahmud Darwish: “Sou a terra”. Diz ele no final desse fragmento, “Oh, vocês, que procuram até a semente do trigo no seu berço/ Passem o arado sobre mim/ Vocês, que vão às montanhas/ Passem sobre mim/ Vocês que vão aos rochedos de Jerusalém/ Caminhem sobre mim/ Vocês que caminharão sobre meu corpo/ Vocês não passarão/ Eu sou a terra feita corpo e/ Vocês não passarão/ Eu sou a terra feita corpo e vocês não passarão/ Eu sou a terra que se ergue e/ Vocês não passarão/ Eu sou a terra, passageiro da terra que se levanta/ Não passarão/ Não passarão/ Não passarão! Muito obrigado. (Palmas.) 

 

(Revisto pelo orador.)

 

O SR. OMAR FERRI: Solicitaria ao Presidente da Casa, antes de passar a palavra ao nosso representante da OLP, que entregasse um quadro que eu trouxe de um Simpósio Internacional realizado em Genebra, na Suíça, em solidariedade ao povo palestino, a Senhora Fátima Ali, e outro quadro ao Bacri, representante da Sociedade Árabe Palestina no Rio Grande do Sul.

 

(O Sr. Presidente procede à entrega dos dois quadros.) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra ao Sr. Mauro Nadvorny.

 

O SR. MAURO NADVORNY: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, senhoras e senhores, Shalom! Tenho certeza de que minha presença, neste ato, causa talvez uma grande estranheza aos presentes. O fato é que aqui estou e não trago comigo qualquer discurso preparado ou qualquer papel escrito que pudesse representar não apenas o meu pensamento, mas o pensamento de outros. Não trago comigo, também, palavras ou fotos que mostram aquilo que nos separa. Trago única e exclusivamente comigo a convicção que em meu coração existe, ainda, lugar suficiente para a paz e o amor que pode haver entre nossos povos. (Palmas.)

Gostaria, apesar de não possuir a dádiva da palavra daqueles que me precederam, de dizer-lhes que a minha presença, aqui, significa transpor uma grande barreira de ódio, de rancores que se construiu ao longo de nossos séculos entre nossos povos. E venho aqui, neste dia, para tentar trazer comigo, ao meu lado, aqueles que estão dispostos a transpor esta mesma barreira e tentar começar a construir – por que não – aqui no Rio Grande do Sul, no Brasil, o plantio de algumas sementes de paz que possam, queira Deus, serem levadas pelo vento e atingirem as terras do Oriente Médio e lá semearem e darem flores, para que influenciem o pensamento daqueles que lá estão para que possam acreditar que é possível encontrar o caminho da paz.

Vejam que na Revista Veja da semana passada tive o prazer de ler um artigo referente a praticamente falência de algumas empresas fabricantes de armamentos. Apesar de ter o pesar pelos trabalhadores que foram dispensados em função disto, tenho certeza que o fechamento destas empresas, e quem sabe o fechamento de outras que ainda poderão acontecer, possam estar a nos mostrar que o caminho da paz e o caminho do reencontro entre os povos finalmente vai poder triunfar. Por uma grande ironia, uma dessas fábricas passou a fabricar antenas parabólicas. Vejam, senhores, que aquele mesmo material que serviu, até pouco tempo, para fazerem balas, para fazerem bombas, para destruir pessoas, serve para fazer antenas parabólicas, que aproximam as pessoas, que podem receber imagens de todo lugar do mundo e descobrir que todos somos semelhantes, onde quer que nos encontremos. Que todos estamos nesta mesma nave chamada terra, que passeia por este espaço sideral, e que, se não formos capazes de termos a consciência de que somos semelhantes em tudo, e que não há porque descriminarmos uns aos outros; e de que é possível como homens, como pessoas racionais, sentarmos à mesa e dialogar, aí sim estaremos construindo uma grande aproximação e dando, quem sabe, um exemplo a esse mundo de que nós, judeus e palestinos, que por força do destino nos dispersamos por todo esse planeta, somos, quem sabe, exemplos de cidadãos do mundo. Cidadãos que foram recebidos nos mais diversos países, e que hoje estamos aqui no Brasil a dar um exemplo de civilidade, a dar um exemplo de compreensão, a dar um exemplo àqueles que ainda insistem em trazer de si rancores e ódios, que nós temos o dever, senão para conosco, mas para nossos filhos, de conseguirmos ultrapassá-los, de virar essa página da história. E ao invés de ficarmos trazendo, e tenho certeza de que muitos ainda assim o tentarão, ainda que não trazendo artigos de jornais, fotos; tenho certeza que enciclopédias inteiras já foram escritas, incitando cada vez mais o ódio entre palestinos e judeus. Creio que esse ódio existe muito mais por força daqueles que não compreendem os nossos povos do que por força de nós mesmos. Tenho a convicção que é possível a nós, judeus, e por que não a nós sionistas e a vocês palestinos, tentarmos aqui edificar meios de trazer uma aproximação entre nossos povos. Eu não tenho a intenção de trazer, aqui, palavras e fatos que nos separam, muito pelo contrário, tenho a intenção de registrar, aqui, aquilo que justamente nos une e o que nos une, hoje, é o fato de que ambos os povos queremos um lugar sob o mesmo sol e sobre a mesma terra. Ambos os povos cantamos as mesmas músicas, ambos os povos dançamos as mesmas danças. Os poemas há pouco aqui lidos identificam em mim o mesmo sentimento que em vocês refletiu.

Portanto, faço aqui, neste dia e desta tribuna, apesar de ter a convicção de que não represento a totalidade do povo judeu, mas a certeza de que represento o pensamento deste povo, de que daqui possa ser levado um apelo ao Sr. Itzak Shamir, um apelo ao Sr. Yasser Yarafat, para que, por favor, dêem uma chance apenas à paz. Proponho que nossas comunidades consigam achar meios de se encontrar e realizarmos juntos, para a comunidade brasileira, uma noite de dança pela paz, com grupos folclóricos judaicos e grupos folclóricos palestinos, numa primeira etapa de aproximação e para que possamos ter a certeza de que isto é possível, e deixarmos para aqueles que lá se encontram, no Oriente Médio, que, quem sabe num futuro breve, possam sentar-se à mesa e negociar, cara a cara, as fronteiras dos dois estados que possuem o direito de lá coexistirem. Por favor, Sr. Representante da OLP no Brasil, passo este pedido ao senhor e aos meus primos que aqui estão, para que juntos possamos tocar os corações dos dirigentes do Oriente Médio: que dêem à paz uma chance. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra ao Sr. Ahmad Sobeh.

 

O SR. AHMAD SOBEH: Sr. Ver. Valdir Fraga, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Sr. Ten. Coronel Álvaro Ferreira, representante do Governo do Estado; irmão Sharif, Presidente da Sociedade da Grande Porto Alegre; Sr. Mauro Nadvorny, representante da Sociedade Judaica neste Estado; Srs. Vereadores e, especialmente, o Ver. Omar Ferri, que com seu esforço tornou possível este encontro com todos os senhores. Que as minhas primeiras palavras sejam de desculpas, porque há cem dias no Brasil, acho que é muito difícil, para mim, fazer discursos muito longos em português. Sem dúvidas, no dia de hoje, o mundo inteiro está rendendo uma homenagem a nosso povo que sofre há 41 anos com lutas contínuas pela independência e soberania nacionais. Dentro de meia hora, em Brasília, o Congresso dos Deputados prolongará sua Sessão Ordinária para convertê-la em uma sessão de solidariedade ao povo palestino, onde tomarão a palavra os Deputados Federais representantes de todas as Bancadas do Congresso Federal em Brasília. Também, nesta manhã, numa Assembléia Geral, em Nova Iorque, 139 países tomaram a palavra em solidariedade a nosso povo; o Presidente Arafat dirigiu uma mensagem à comunidade internacional. Na verdade, nosso povo tem uma grande dívida de solidariedade com os povos do mundo, porque nesses longos anos de lutas recebeu solidariedade contínua dos povos, governos, partidos, congressos, sindicatos e sociedade em geral. E nosso povo palestino partilha essa solidariedade com outros povos que estão lutando hoje também, por sua independência política e social no mundo.

Hoje, saudamos também a independência da Namíbia e a vitória dos Swabs nas eleições. Também, saudamos a luta dos povos do Sudeste Asiático, os povos do Centro América e todos os outros povos que compartilham com nosso povo, hoje, a luta pela independência real e verdadeira.

Em nossa história, nunca um exército saiu da Palestina para agredir ninguém. Ao longo da história, nunca a Palestina se transformou em invasor para ocupar terras de ninguém. Mas, nossa terra, através da história, sofreu todo tipo de invasão. Todas as primeiras potências militares de cada época da história ocupam a Palestina. Mas a história de nosso povo pode ser resumida em uma relação inquebrantável entre homem, história, civilização e reivindicações nacionais. Nunca em nossa história nosso povo foi arrancado em sua totalidade de sua terra. E, hoje, a demonstração está à vista de todo mundo, como fica um povo ocupado, reprimido, massacrado e ao mesmo tempo heróico em sua luta pela independência e soberania nacionais. (Palmas.)

Nosso povo, que foi mandado pela força militar a acampamentos de refugiados, também soube trabalhar duramente, porque as pesquisas da UNESCO, hoje registram que o povo palestino tem o 4º lugar no mundo em nível universitário, sem ter soberania, ainda, em seu próprio Estado. Os profissionais palestinos desempenham, hoje, um papel fundamental no desenvolvimento de todos os países árabes, irmãos, e também em convênios de cooperação mantidos pela OLP com 39 países, entre países do Terceiro Mundo. De tal maneira que o povo palestino, hoje, está pedindo pela paz dos valentes, como disse o Presidente Yasser Arafat; uma paz de uma posição de firmeza e de força, não uma imposição militar. Ao contrário, a imposição nas guerras só pode durar o tempo que a outra parte precisa para voltar a ter armas. A paz verdadeira é a que se trata com o inimigo verdadeiro.

Não é justo que o governo sionista de Israel que entrou em guerra seis vezes contra a OLP, queira fazer a paz com outra parte que não seja a OLP. Não é justo, hoje, que o governo sionista de Israel insista em escolher os representantes palestinos com os quais quer negociar. Não é justo hoje, que o governo dos Estados Unidos chegue a acordos com a União Soviética em todas as partes do mundo, menos no Oriente Médio. O Oriente Médio segue recebendo, hoje, 60% das armas vendidas no mundo. Em nenhum momento de aproximação, em nenhum momento de acordos e em um momento em que a Namíbia está resolvendo o seu caso, em que a guerra Irã-Iraque terminou, em que o caso do Afeganistão está no início de uma solução, em quem a América Central há início de acordos, a contradição da política do governo Presidente Bush segue sendo a do Oriente Médio. No ano passado iniciou um diálogo oficial e substancial, segundo a terminologia dos Estados Unidos e da OLP, e a um ano deste diálogo, o governo Bush segue falando no nome do governo Shamir, que é um homem que ainda utiliza uma linguagem da Idade Média para resolver os problemas de hoje. Um homem que em 1974 era procurado pela Interpol como terrorista. O governo de Shamir é que está assassinando e matando nossos filhos, que num levante ininterrupto, que em dez dias cumpriremos dois anos, onde até agora os soldados israelenses mataram 1094 palestinos, onde se registraram até hoje, 49 mil feridos e 60 mil presos. Só nestes dois anos de levante popular palestino.

Na Palestina, nunca na história se registrou um só caso de discriminação religiosa e não aceitamos lições do mundo sobre a tolerância religiosa, porque nosso povo, nossa terra deu a todo o mundo as três religiões monoteístas existentes. Quando os judeus foram perseguidos pela Europa na Idade Média, encontraram na Palestina um refúgio, uma tolerância e uma sociedade apropriada para sua cultura e seus direitos. A comunidade judaica do mundo e daqui do Brasil se quiserem fazer a paz tem que pressionar os dois, à vítima e ao verdugo ao mesmo tempo. Porque, hoje, o povo palestino na ONU, o povo palestino no mundo já apresentou seu próprio plano de paz, aceito pela Assembléia Geral da ONU, um plano de paz que está sendo rejeitado somente por dois governos, Estados Unidos e Israel. O apelo a Yasser Arafat já foi feito, o mundo hoje tem que distinguir muito claramente quem é o terrorista, ou aquele filho palestino com a pedra na mão, ou o soldado israelense que está matando o filho palestino. Hoje, o apelo a Arafat foi respondido positivamente por ele próprio e por todo o povo palestino. Paz, na Conferência Internacional de Paz para o Oriente Médio, convocada pela ONU, com base em sua resolução sobre o particular, com a participação dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, para garantir qualquer solução, com a participação de todas as partes incluídas no conflito. A paz não se faz entre amigos; entre amigos se pode falar de tudo, se pode falar de teatro, de cinema, de tudo. A paz se faz entre inimigos. É isso que estamos oferecendo hoje. E as comunidades judaicas do mundo, as quais a OLP há 14 anos respeita, valoriza, saúda e apóia em todas as lutas das forças democráticas judaicas que reconhecem nossos direitos nacionais do retorno, da autodeterminação nacional e nosso direito inalienável de constituir nosso próprio Estado independente. Mas, não temos que inventar nada, nosso mais absoluto respeito, às lutas de todas as forças judaicas dentro e fora de Israel que aceitam o que o mundo todo está aceitando em relação aos nossos direitos. E a pressão deles deve ser dirigida a esse governo anti-judaico que é o governo de Shamir, porque, com essa política intransigente, o governo de Shamir não só está matando os filhos palestinos, como também colocando em perigo a própria segurança dos judeus.

Acho que, hoje, a paz é um direito, a paz é justiça, e o povo palestino não tem nada mais para dar. O povo palestino tem linhas vermelhas que não pode cruzar, a OLP hoje está negociando todas as modalidades que podem chegar a uma paz. Mas todo o mundo tem que ter certeza de que o povo palestino não está mais atrás em sua independência nacional. Não aceitamos menos que o nosso Conselho Nacional Palestino já proclamou, nada menos que um Estado Palestino independente, que 107 países, em um ano, já reconheceram formal, jurídica, política e diplomaticamente. Em um ano! Enquanto que o atual governo de Israel mantém, há 41 anos a criação do Estado de Israel, relações diplomáticas com 70 países. A vigência dos nossos direitos, hoje, não é matéria de negociação. A negociação diz respeito a como dar garantias e soluções dentro de um marco de direito internacional para quem necessita e precisa delas. Quem precisa de garantias no Oriente Médio? O Estado de Israel, que tem o arsenal de guerra mais sofisticado dos Estados Unidos, ou o futuro Estado Palestino independente? Em psicologia o que Shamir precisa não se chama segurança, chama-se mania de perturbação. Para que ter tantas armas, ele que tem ocupado parte dos territórios árabes, não só na Palestina, como também na Síria, no Líbano, quer segurança? A única segurança real é o reconhecimento do direito nacional do povo palestino, e estamos dispostos, hoje ou amanhã, chegar a esta Conferência Internacional, para alcançar uma solução aceitável e viável que nos dê o direito a uma nova oportunidade de lavrar civilização, de realizarmo-nos coletivamente, em nossas casas, em nossa terra, em nosso país.

Os palestinos, hoje seis milhões de habitantes, reclamam e lutam pela independência nacional. A OLP não aceita nenhum tipo de negociação sobre seu absoluto direito a nomear, designar e anunciar qualquer representante da negociação futura numa conferência internacional de paz. A unidade nacional de nosso povo, dentro e fora da ocupação, a unidade nacional da própria OLP que nunca foi concebida pelos palestinos como um partido político, uma organização militar. A OLP sobrevive, avança e chega a triunfos para o seu povo, porque a OLP sempre foi a pátria moral dos palestinos, onde cabem todas as idéias, onde cabem todas as tendências e onde todos estão unidos para chegar a um Estado Palestino independente.

Reitero, Senhor Presidente, nosso agradecimento por esta mostra real de solidariedade com o nosso povo que hoje está em greve geral nos territórios ocupados comemorando este Dia Internacional de Solidariedade com o nosso povo. E para terminar, permita-me entregar ao Sr. Presidente da Câmara uma cópia da carta do Presidente Arafat ao mundo inteiro por motivo do Dia Internacional de Solidariedade para com o Povo Palestino, uma mensagem que foi lida esta manhã pelo Sr. Representante da Comissão Palestina, na própria Assembléia Geral da ONU, e foi distribuída ao mundo inteiro como forma de agradecimento de nosso povo a todos os nossos amigos, aqui no Rio Grande do Sul, nesta Câmara, ao Brasil, aos partidos políticos, ao Brasil Governo, ao Brasil Congresso, Sindicatos e ao povo em geral, que sempre está ao lado de nosso povo, que seguirá lutando até chegar a nosso Estado Independente, com Jerusalém como Capital, sem nenhum tipo de dúvida. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: A solidariedade do povo de Porto Alegre aos irmãos palestinos. Aceitem nosso abraço. (Palmas.)

Encerramos a presente Sessão Solene.

 

(Levanta-se a Sessão às 17h51min.)

 

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